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quarta-feira, 11 de abril de 2012

TEXTO 15 - ARTE JAPONESA.

PESQUISADO E POSTADO, PELO PROF. FÁBIO MOTTA (ÁRBITRO DE XADREZ).

REFERÊNCIA:
http://www.pitoresco.com.br/art_data/japonesa/



As bases da arte japonesa

Uma série de princípios estéticos como o do miyabi (elegância refinada), mono no aware (pathos da natureza), wabi (prazer da tranqüilidade) e sabi (simplicidade elegante), às vezes de difícil compreensão no Ocidente, constituem as bases da arte japonesa, cuja característica essencial, desde os tempos mais remotos, é configurar um mundo de perfeita harmonia e serenidade.

Período pré-budista

Não se dispõem de muitas informações sobre a primitiva história cultural do Japão, mas os raros exemplos de arte pré-budista (ou seja, anteriores ao Século 6º) já exibem certas características especificamente nipônicas, expressadas na haniwa, figuras fúnebres de argila, e nos dotaku, sinos de bronze cobertos de inscrições.

O período pré-budista costuma ser dividido em três culturas distintas: a Jomon, de 2.500 a.C. até o Século 3º a.C.; a Yayoi, do Século 3º a.C. ao Século 3º da era cristã; e a Tumular ou Kofun, que medeia aproximadamente do ano 250 ao 500.

A cultura Jomon atingiu praticamente todo o arquipélago japonês. Os objetos artísticos eram principalmente peças cerâmicas (vasos e pequenas figuras), com decorações estriadas (jomon).

A cerâmica Yayoi é avermelhada e mais fina que a Jomon. Junto com a cerâmica, foram encontrados também dotaku e espelhos, armas, objetos de vidro e jade.

Como a nação japonesa se formou mediante sucessivas vagas de imigração oriundas da Indochina, Indonésia, ilhas do Pacífico e, a partir da era cristã, da Coréia, entre os Séculos 3º e 6º da era cristã estabeleceu-se a cultura eneolítica coreano-japonesa e nos dois países acham-se idênticos objetos de bronze (espadas, punhais, espelhos circulares etc.).

Na época Tumular ou Kofun, construíram-se grandes túmulos para nobres e príncipes, como a tumba de Nintoku Teano, com 2.718m de diâmetro e 21m de altura, que data provavelmente do ano 399 e tem as paredes cobertas de pinturas policrômicas rudimentares que representam sóis, triângulos e espirais. Várias haniwa foram encontradas perto de túmulos das cercanias de Yamoto.

Período Asuka (552-710)

A introdução do budismo no Japão, a partir do Século 6º, durante o chamado período Asuka (em que esta cidade foi a capital do país), deu grande impulso à arte em geral.

A escultura foi influenciada pelas artes chinesas Wei, Sui e Tang; no final do período, porém, tornou-se mais sensível e graciosa, adquirindo peculiaridades próprias.

Período Nara (710-794)

No Século 8º, a capital foi transferida para Nara, que se tornou o maior centro cultural, tão magnífico quanto Changan, a capital chinesa cujo modelo seguira.

A escultura floresceu, e a decoração dos principais edifícios foi feita em tons nuançados (ungen). As estátuas de meados do Século 8º, imponentes e agradáveis à vista, dão a sensação de movimento real.

Os materiais mais empregados são madeira pintada, laca, papier mâché, bronze e argila. Estátuas realistas e máscaras grotescas, usadas nas danças cômicas do gigaku, completam a produção escultórica.

Período Heian (794-1185)

Heianjo ou Hioto, cidade já construída sob a influência da família Fujiwara, tornou-se a capital a partir de 794.

O estilo japonês começou a libertar-se da influência chinesa, à medida que, na China, a dinastia Tang se enfraquecia.

Também a seita shigon inspirou importantes obras de arte, quase todas destruídas séculos depois.

A partir de 897 a família Fujiwara impôs ao país seu domínio e, paralelamente, um modelo estético que marcou todas as obras de arte: estas ganharam mais leveza e elegância, a policromia prevalece e as figuras humanas mostram-se de uma finura aristocrática, de linhas predominantemente femininas.

O maior pintor do Século 9º foi Kose Kanaoka, criador do estilo Kose. A ilustração de poemas e contos tornou-se então um gênero artístico muito apreciado. Esse tipo de pintura, em rolos de papel que se desdobravam, criava a sensação de movimento no espaço e sucessão no tempo.

Sob a hegemonia dos Fujiwaras, as artes floresceram. A planta em T do pavilhão do Fênix no templo Byodoin, entre Quioto e Nara, reproduz os palácios místicos do céu e ostenta um Amida de Jocho, escultor do Século 9º cuja concepção do Buda marcou a escultura religiosa do século XIX.

A prática de incrustar os olhos das estátuas começou no Século 12. As cores intensas da pintura Fujiwara são realçadas por folhas de ouro recortadas (kirikane).

Com a escola de Kasuga, começou a yamoto-e, pintura narrativa puramente japonesa que, segundo a tradição, foi inventada pelo pintor Tosa.

Período Kamakura (1192-1333)

Com a derrubada da família Fujiwara, Minamoto Yoritomo estabeleceu o xogunato e fixou-se em Kamakura.

O espírito vigoroso dessas gerações de guerreiros, que governaram o Japão nos 700 anos seguintes, traduziu-se no modo simples e desafetado de observar e expressar a natureza, o que transparece nas esculturas de Unkei (Os patriarcas da seita Hosso,

Os 12 acólitos de Fudo, A trovoada e o vento) e seus seguidores, nas pinturas em rolo (embaki), ainda próximas da arte chinesa do período Sung, e nas máscaras do bugaku, dança que veio substituir o gigaku.

O reatamento das relações com a China e a introdução do zen-budismo reforçaram então a influência chinesa (sobretudo Sung e Yüan), especialmente na pintura monocrômica de paisagens.

As maiores obras-primas da pintura narrativa -- Ban-Dainagon, Shigizan-engi, Taemamandara no engi --, foram produzidas em rolos de cerca de cinqüenta centímetros por 9 a 12m, de efeito quase fotográfico.

O Yamoto-e, do Século 13, superou mesmo os rolos chineses e narra acontecimentos históricos, biográficos e religiosos. Também a arte do retrato espelhou o novo realismo.

Período Muromachi (1338-1573)

Sob a hegemonia da família guerreira Ashikaga, Quioto, que fica no distrito de Muromachi, voltou a ser a capital do país.

A simplicidade do modo de vida dos samurais caiu em desuso, embora aumentasse o prestígio do zen-budismo, a cuja sombra as artes muito se desenvolveram.

A porcelana experimentou rápida evolução, em correlação com a cerimônia do chá (cha-no-yu). As porcelanas Imari e Satsuma, cujas formas se destinavam a ser apreciadas com os olhos e as mãos, denotam a influência chinesa.

Por essa época surgiu o Suiboku, estilo de pintura intimamente ligado ao zen-budismo e que apreciava as aguadas de nanquim em preto e branco.

O primeiro grande pintor dessa técnica foi Shubun. Destacou-se também Sesshu, "o pintor da chapada de tinta", que desenvolveu estilo mais pessoal.

A escola Kano de pintura surgiu pelas mãos de Kano Motonobu, no final de um período marcado pelo esvaziamento da pintura budista, e deu sabor japonês a um estilo essencialmente chinês.

Período Momoyama (1574- 1603)

A arte deste período, extraordinariamente vívida e brilhante, foi uma reação à severidade do estilo Ashikaga.

Os artistas da segunda e terceira geração da escola Kano inventaram os painéis desdobráveis de sete faces (conhecidos no Ocidente como biombos), que representavam cenas populares, mulheres, samurais e paisagens. Destinavam-se a ornamentar palácios e castelos, como o de Momoyama, que deu nome à fase.

O cristianismo, levado no Século 16 pelos portugueses, teve repercussões profundas na arte nacional. Os temas cristãos, copiados por artistas japoneses ocidentalizados, começaram a aparecer na pintura.

Embora a maior parte das obras desse período tenha sido destruída com a perseguição iniciada em 1638, dois exemplos do Século 17 sobreviveram: o Retrato de São Francisco Xavier (Museu de Kobe) e Os 15 mistérios do rosário (coleção Azuma). Tais obras, ao lado de cenas em estilo europeu, foram chamadas pinturas namban, ou seja, "dos bárbaros sulinos".

Entre os pintores japoneses impermeáveis à influência ocidental figuram os muralistas Eitoku, Chockuan, Sanraku e outros.

Honami Koetsu, pintor, gravador, calígrafo insuperável, ceramista e poeta, fundou com Sotatsu uma escola essencialmente nipônica.

A influência da escola Tosa fez-se sentir no tipo de pintura que ilustrou o começo do teatro profano (tagasode).

Período Edo (Ukiyo-e)
(1603 a 1868)

O período Edo foi dominado pela família guerreira dos Tokugawas, que escolheu a cidade de Edo (mais tarde Tóquio) como capital e impôs seu jugo ao país por mais de 250 anos.

No início da década de 1630, os cristãos foram perseguidos e expulsos, e o Japão cerrou as portas a todos os estrangeiros. Esse isolacionismo empobreceu as artes.

Ainda assim, os pintores Ogata Korin e Ogata Kenzan procuraram revitalizar a pintura Yamato-e e sobretudo Ike Yosa Buson, Uragami Gyokudo Taiga foram os melhores representantes da escola sulina Nanga.

Ike Yosa Buson, Uragami Gyokudo Taiga e Rosetsu, pintores das escolas Maruyama, conhecida também como Shijo, pregaram o estudo da natureza.

Os artistas da quarta geração Kano, com ateliês em Quioto, e os Tosa, em Sakai, aproximaram seus estilos. O mestre da época foi Tosa Mitsuoki, que se inspirou em lembranças da Idade Média e assuntos chineses.

A mais importante manifestação artística do período, porém, foi o estilo Ukiyo-e, cujo nome tem origem num provérbio japonês do Século 18 ("o mundo inspira desgosto").

Criado por Iwasa Matabei no final do Século 17 e imortalizado sobretudo através da estampa, o Ukiyo-e tornou-se muito popular no Ocidente e teve profunda influência sobre os impressionistas franceses.

O Ukiyo-e não foi uma escola como Tosa ou Kano, mas um movimento artístico que veio da época Momoyama e representou para a nova burguesia festas, cenas galantes e do teatro profano. Seu tema principal, porém, é a bijin-ga (mulher bonita).

Inicialmente limitada ao contraste entre preto e branco, a técnica foi aperfeiçoada e recebeu, a princípio, uma tonalidade alaranjada (tan-e), depois efeitos de vermelho, laranja, amarelo e púrpura (urushi-e).

Mais tarde, desenvolveram-se os processos benizuri-e (vermelho e verde) e nishiki-e (dez e mais tonalidades).

Entre os maiores artistas no gênero sobressaíram Kyionobu, Suzuki Harunobu, Koriyusai, Kiyonaga, Sunsho e Sharaku (os dois últimos famosos por seus relatos de atores), Kitagawa Utamaro (figuras femininas), Katsushika Hokusai e Ando Hiroshige (paisagens) e Igusa Kuniyoshi (figuras humanas).

Período Meiji (1868-1912)

A partir da dinastia Meiji, o Japão abriu suas portas ao Ocidente e passou a assimilar outras culturas contemporâneas, em processo contínuo que gerou uma simbiose muito particular entre tradição e modernidade.

No começo do período Meiji houve até mesmo repressão às artes tradicionais: a ação de Ernest Fenollosa, erudito americano, e os esforços do crítico de arte Okakura Kakuzo (ou Tenshin), conseguiram que governo e artistas tomassem providências para revitalizar o espírito da criação e preservar o patrimônio cultural do país.

Já no Século 20, sob a liderança de Yamamoto Kanae, um grupo de jovens gravadores treinados no Ocidente revigorou as artes gráficas japonesas.

O abstracionismo informal de Kosaka Gajin influenciou decisivamente a pintura ocidental, através dos Estados Unidos.

Entre os primeiros grandes inovadores, que neste século deram a pinturas japonesas fama internacional, estão artistas como Yukey Tejima e Yuchi Inuie. Artistas japoneses obtiveram prêmios internacionais, como Maeda, Yoshisighe Saito e Tadamaro Nogami.

Outras artes

A cerâmica, que já existia desde a época de Nara, teve seu apogeu entre os séculos 17 e 19.

Quanto aos metais, no fim do período Muromachi, já havia bules de ferro do ateliê Ashiya para a cerimônia do chá. No Século 17, foram criadas peças rebuscadas de bronze dourado ou esmaltado para os palácios Momoyama e para os mausoléus dos Tokugawa.

O uso da laca foi estritamente subordinado à utilidade do objeto. Do período Muromachi existem caixas de remédio em lacre preto e ouro fosco. As máscaras de laca para o teatro nô, muito populares no início do Século 15, praticamente desapareceram.

Fonte: Encyclopaedia Britannica do Brasil.

Periodo Edo (Ukiyo-e)
(1600-circa a 1867)

Ukiyo-e (pronuncia-se «ukioei») foi um estilo popular de arte no Japão durante o período Edo, barata e trazendo cenas da vida cotidiana (Edo, a nova capital do Japão, mais tarde passou a chamar-se Tóquio).

Esse nome (Ukiyo-e) pode ser traduzido como «mundo flutuante», um nome irônico dado ao planeta terra, que os budistas chamavam de «mundo do desgosto».

Ukiyo, em verdade, era o nome dado ao estilo de vida japonês nos centros urbanos, com seus figurinos, a alta sociedade e os prazeres da carte. O Ukiyo-e documenta essa era.

A arte Ukiyo-e é especialmente conhecida por impressões em blocos de madeira. Na medida em que o Japão começou a se abrir para o ocidente, após 1867, essas gravuras passaram a ser conhecidas, exercendo sua influência na arte européia, especialmente na França.

A essa releitura da arte japonesa, deu-se o nome de «japonismo». Entre os pintores influenciados pelo japonismo, pode-se citar Toulouse-Lautrec, Edgar Degas, Vincent van Gogh, James McNeill Whistler, bem como os artistas gráficos conhecidos por «Les Nabis».

Considera-se como formador da escola Ukiyo-e o artista do Século 17 Hishikawa Moronobu. Entre outros nomes que se tornaram famosos, pode-se citar Hiroshige, Hokusai, Utamaro e Sharaku.

Fonte: Artcyclopedia.

TEXTO 14 - Arte e Arquitetura da China - História da Arte e Arquitetura da China.

PESQUISADO E POSTADO, PELO PROF. FÁBIO MOTTA (ÁRBITRO DE XADREZ).

REFERÊNCIA:

http://www.historiadomundo.com.br/chinesa/arte-arquitetura-china.htm

Introdução.

arte e arquitetura da China desde a Idade da Pedra até o século XX, que representa as conquistas mais significativos da civilização mais antiga do mundo. O princípio fundamental de todos os aspectos da cultura chinesa é o equilíbrio harmônico e, assim, sua arte é uma sutil mistura de tradições e inovações, de idéias autóctones e estrangeiras, de imagens profanas e religiosas.

Desenvolvimento Histórico

Os imperadores chineses foram os primeiros e os mais assíduos mecenas artísticos. Muitos artistas e arquitetos eram empregados do governo que trabalhavam por encargo real. Em contraste, os artistas aficionados, que em muitos casos eram funcionários retirados ou exilados, podiam trabalhar sem as limitações que a corte impunha e suas obras refletiam um individualismo importante, alijado dos estilos imperiais. A subida ao trono ou a derrota das diferentes casas reais afetava profundamente o desenvolvimento da arte na China, mas todas elas compartilhavam o interesse de manter a tradição. Os governantes, sobretudo os que estabeleciam uma nova dinastia, ansiavam confirmar-se ante os olhos de seus súditos e a melhor maneira de conseguir seu apoio era dando prosseguimento às realizações artísticas das dinastias anteriores. A corte aceitava também as novas correntes procedentes da Índia e do Oriente Médio, porém cuidando de entrelaçar qualquer idéia inovadora em matéria de arte, religião e filosofia à trama já existente da vida chinesa.

Dinastia Shang

A civilização Shang (c. 1480-1050 a.C.) nasceu diretamente do desenvolvimento que teve lugar durante o período neolítico (4000-2000 a.C.), importante época na história da China. Neste período, com o começo da agricultura e da domesticação de animais, começaram a se estabelecer os povos. Com este novo sistema de vida, iniciaram-se os ritos funerários mais antigos que se conhecem. Os objetos de uso cotidiano eram enterrados com o defunto e, graças a isso, chegaram até nós em bom estado de conservação. As tumbas neolíticas têm revelado uma grande variedade de cerâmica, sobretudo grandes vasilhas pintadas, provavelmente urnas funerárias, e taças de argila negra polida, feitas no torno e talvez utilizadas em algum ritual.

Em 1975, os arqueólogos chineses que trabalhavam na região de Anyang descobriram a tumba da esposa favorita de um rei Shang, onde encontraram mais de 400 vasilhas de bronze e armas, além de 600 peças de jade e de pedra. A grande qualidade artística destes objetos, entre os quais havia figuras de jade e bronze lindamente talhadas com formas de animais e de pássaros, é uma prova do desenvolvimento da arte chinesa pertencente à primeira dinastia.

Dinastia Chou

Os reis Shang não puderam controlar o crescente poder da tribo vizinha, os Chou (c. 1027-256 a.C.), estabelecida em sua fronteira ocidental. Foi no ano de 1027 a.C. que os Chou conquistaram Anyang e assentaram sua dinastia na cidade. A arte do período Chou oriental posterior mostra a diversidade e a qualidade técnica características de toda a história da arte da China. Nas tumbas da dinastia Chou oriental descobriram-se pinturas sobre seda que constituem as mostras mais antigas desta técnica, assim como esculturas em madeira e obras de laca e cerâmica vitrificada que falam de novos desenvolvimentos técnicos e dos estilos artísticos.

Dinastias Quin e Han e as 6 Dinastias

A dinastia Quin teve um importante papel na história da China, apesar de sua brevidade (221-206 a.C.). O enfraquecimento político do império Chou oriental terminou com a consolidação do poder do imperador Quin Shi Huangdi, do qual procede o nome de China. Após sua morte, este poderoso governante foi enterrado na província norte-ocidental de Shanxi, num túmulo funerário maciço, descoberto recentemente. Nesta tumba real apareceram mais de 6.000 figuras de terracota (entre homens e cavalos), destinadas a proteger a cripta. Representam um dos regimentos do imperador, composto por oficiais perfeitamente equipados, aurigas, arqueiros e jovens soldados a pé. O exército estava pintado com uma ampla gama de cores brilhantes, que, com o passar do tempo, se apagaram.




Esta vasilha com orelhas, assim chamada pela forma de suas asas, foi feita na China durante a dinastia Han (206 a.C. -200 d.C.). Por fora, é feita em madeira laqueada em negro com detalhes em vermelho e, por dentro, em vermelho com detalhes em negro e ouro. É possível que tenha formado parte dos bens funerários que se enterravam com os mortos.

Iniciada em fins da dinastia Chou, a arte da pintura floresceu durante o período Han. Os temas mais freqüentes eram episódios da vida no além e lendas de antigos heróis. Essas pinturas revelam uma evidente intenção de representar o espaço e a distância. Também durante este período apareceram os primeiros elementos de representação da paisagem.

A riqueza da corte Han não pôde evitar a derrocada da dinastia no ano 220 a.C. Os séculos que se seguiram, durante os quais os clãs rivais trataram de controlar partes do Império, são conhecidos como o período das Seis Dinastias (220 a.C.-589 d.C.). Durante este período a arte recebeu a influência das novas idéias e de importantes progressos religiosos, como o confucionismo e o taoísmo, que propiciaram novos temas e estilos. O budismo, chegado à China da vizinha Índia, teve um profundo efeito sobre a arte do período das Seis Dinastias. Os primeiros exemplos da arte budista que vieram da China foram as estatuetas levadas pelos budistas indianos. No século IV, a afluência de estilos e de temas produziu uma nova categoria de arte e arquitetura budistas dentro da tradição chinesa. Na China Ocidental, todavia, podem ser contempladas, no mosteiro de Dun-huang, importantes pinturas murais baseadas em histórias sagradas.

Importante contribuição à arquitetura do período foi o pagode de madeira, baseado na stupa indiana, na torre da dinastia Han. No século VI, praticamente todas as facetas da vida cultural chinesa estavam inspiradas no budismo.

Ainda que a arte budista dominasse quase todas as obras das Seis Dinastias, também estava ocorrendo uma mudança nas tradições profanas. A esse período pertence Gu Kaizhi, considerado o pai da pintura paisagística. Também houve progressos no terreno da cerâmica. Os primeiros vasos reconhecíveis, chamados Yue-yao, são de grés vitrificado em verde e foram fabricados nos tornos da província de Zhejiang. Esta cerâmica era muito duradoura e utilizada, sobretudo, na fabricação de cuias e jarros que chegaram a ser exportados para lugares tão distantes como as Filipinas e o Egito.

Dinastia Tang

A dinastia Tang (618-907) propiciou um grande desenvolvimento artístico, sendo este período conhecido como a Idade de Ouro da China. O país havia se consolidado, em primeiro lugar durante o breve mandato da dinastia Sui (589-618) e, em segundo, já de forma mais segura, pelo jovem monarca Taizong, no ano 618. A estabilidade do governo e a conseqüente prosperidade econômica propiciaram um florescimento de todas as manifestações artísticas: pintura, cerâmica, música, poesia e artesanato em metais. Os budistas sofreram períodos de perseguição durante a era Tang, porém, na arte chinesa, a influência de sua religião perdurou. A pintura budista manteve sua importância durante o período Tang, mas a paisagem profana passou a dominar as artes pictóricas. São três os nomes de pintores conhecidos dessa época: Wang Wei, criador da paisagem monocromática, que preferia as paisagens nevadas, cheias de intimidade e de tranqüila melancolia; e, em contraste com seu estilo, Li Sixun e seu filho Li Zhaodao (ativos em 670-735), de caráter marcadamente monumental.

Nesse período, aperfeiçoou-se a pintura de retratos, iniciada na era Han. A inovação é a característica principal do período Tang em relação às artes decorativas. Os comerciantes e artesãos de diferentes nacionalidades trouxeram importantes influências procedentes do Oriente Médio, que estimularam a criação de novos estilos em metais e cerâmica. Os frascos de viagem e os pratos de ouro e prata, com grande variedade de formas, lembram as tradições da Ásia Central. Os vistosos jarros de louça, sobretudo jarras e vasilhas para beber, feitos a partir de protótipos de metal, lembram muito a ourivesaria persa. É importante a cerâmica desse período, pois, graças a uma técnica desenvolvida no sul da China, era possível a cozedura de uma substância branca, de grão fino, que hoje se conhece como porcelana.

Dinastia Song

Nos anos que se seguiram à queda do governo Tang, o território da China ficou reduzido, em conseqüência das invasões dos povos vizinhos. Os imperadores Song (960-1270) não eram tão poderosos como seus predecessores Han e Tang. Esforçaram-se para manter uma paz pouco sólida com seus quase sempre hostis vizinhos e as artes da época denotam uma introspeção e um refinamento cultivados como resposta à áspera realidade política. Os imperadores Song se caracterizavam pela erudição e muitos deles eram, inclusive, consumados artistas. Com freqüência, alude-se à pintura deste período, abundante em escolas e em estilos, como a maior realização da arte Song. Fundou-se uma academia real de pintura e a própria corte patrocinou numerosos artistas.

Durante esse período (960-1126), os pintores inclinavam-se a um estilo monumental, criando impressionantes panorâmicas. Artistas como Li Cheng, mestre dos planos horizontais e distantes (ativo no século X), e Fan Kuan, que segue fielmente a natureza (ativo no princípio do século XI), destacaram este estilo com suas vistas imponentes de escarpados rochosos, interrompidos por alguma cascata ou por algum grupo de figuras pequenas.

No século XII, a academia de pintura imperial criou um estilo de paisagem conhecido como escola de Ma-Xia, devido ao nome de seus principais representantes: Ma Yuan e Xia Gui. Estes criaram paisagens menos elaboradas, utilizando as sombras para sugerir a massa terrestre e para conferir à obra um aspecto ligeiro e etéreo.

A cerâmica dos períodos Song setentrional e meridional é comparável à pintura de paisagem no tocante à variedade e às realizações.

A tendência Song para o refinamento pode ser apreciada também no que diz respeito à arquitetura do período. Os estilos Tang foram se alongando e afinando e deram lugar a umas agulhas características do estilo Song. Os telhados curvos, típicos da arquitetura chinesa, alcançaram seu apogeu nesse período.

Dinastia Yuan

A invasão dos mongóis (1279-1368) produziu alterações na natureza da arte chinesa, sobretudo na pintura e na escultura. Embora os governantes estrangeiros tivessem interesse em perpetuar a cultura clássica chinesa, a maioria dos artistas não estava feliz na corte e se retirou. A pintura e a caligrafia se converteram em atividades destes ex-funcionários. Wenren hua, a arte dos aristocratas independentes durante a dinastia Song, foi, durante o período Yuan e o seguinte, a escola artística mais importante; continuavam sendo conhecidos como os eruditos e depreciavam os pintores que se vincularam à academia de conservadores e os imitadores.



Pintura do artista chinês Ma Yuan (século XIII), o pintor mais importante da dinastia Song setentrional. Este artista era conhecido por "Ma, o de uma esquina", porque, em suas pinturas, só chegava a uma esquina da tela, deixando o resto do quadro em branco.

Além da considerável diferença de estilo, a pincelada dos pintores wenren era mais acentuada e segura que a dos artistas Song meridionais. As rochas e as árvores, que na escola Ma-Xia se apresentam difusas, aparecem com força na obra dos pintores Yuan. Já não se utiliza a bruma para sugerir a distância e o infinito e a amplitude dá lugar a um interesse mais dramático pela forma. Huang Gong-wang, Ni Zan, Wu Zhen e Wang Meng representam a diversidade característica deste período.

Desde os tempos pré-Tang a caligrafia era considerada um ramo da pintura. Juntamente com a poesia e a música, constituía uma parte importante da formação intelectual dos cavaleiros. A caligrafia, como a pintura, dá mostras das possibilidades quase infinitas do pincel. A corte dos mongóis fez grandes progressos nas técnicas de fabricação da porcelana. Em meados do século XIV, foram fabricaram as primeiras mostras fechadas de porcelana decorada com cores aplicadas antes do vitrificado.

Os mongóis fizeram importantes incursões também no campo da arquitetura. Hoje se crê que as estruturas originais da capital mongol, Pequim, eram maiores que as estruturas Ming que as substituíram.

Dinastia Ming

O governo mongol terminou com o estabelecimento da dinastia chinesa Ming, que se estendeu entre os anos de 1368 e 1644. A corte fundou imediatamente a academia real de pintura, que atraiu, principalmente, os pintores de pássaros e de flores e os paisagistas da escola Ma-Xia. Do grupo que encabeçava os wenren Ming, chamado escola de Wu, saíram numerosos artistas importantes, entre os quais destacam-se Shen Chou e Wen Zengming. A pincelada de Shen Chou denota uma linha rigorosa, que proporciona claridade a suas obras, inspiradas com freqüência em temas cotidianos, como um grupo olhando a lua de um terraço. Wen Zengming preferia os temas de grande simplicidade, como uma árvore ou uma rocha, e sua obra transmite a força que vem da solidão, talvez como reflexo de seu desencanto com a vida na corte.

O período Ming é famoso por suas artes decorativas. Introduziu-se uma nova técnica: uma vez que a porcelana havia sido vitrificada e a cozedura feita à temperatura necessária, pintava-se a peça com esmalte da cor desejada e ela voltava ao forno uma segunda vez. Graças a este invento, podia-se decorar a mais fina cerâmica chinesa com uma infinita variedade de cores brilhantes.

Dinastia Oing

Os últimos anos da dinastia Ming foram marcados por grandes dissidências políticas internas. Esta situação era observada pela vizinha Dongbei Pingyuan ou Manchúria. Uma dinastia oriunda desta região, os Qing, aproveitando as revoltas, subiu ao poder em 1644 e nele se manteve até 1912. Desejosos de assimilar as tradições das dinastias anteriores, os governantes Qing abraçaram todos os aspectos da cultura chinesa.

A corte continuou patrocinando uma academia real de pintura, mas a qualidade de sua produção não ia além da boa imitação dos estilos Song.

O monge budista Kun Can trabalhava como os pintores Zen do período Song meridional. Muitas de suas figuras se apresentam distorcidas, embora não cheguem a ser abstratas, e seus pássaros e rochas, executados velozmente, conservam a forma orgânica.

As artes decorativas do período Qing denotam mais técnica que beleza. O processo de esmaltado se aperfeiçoou durante esta época.

Os estilos ornamentais preferidos na época Ming foram seguidos pelos artistas Qing nas obras com metais, no laqueado e no entalhe em jade. Eram únicos no minucioso trabalho com o cristal soprado. Os móveis de madeira decorados com laca, algumas vezes dourada, tinham grande aceitação na corte imperial e entre os funcionários ricos e os comerciantes.

Também na arquitetura continuaram muitas das tradições Ming. Os mongóis haviam rechaçado o delicado estilo Song, iniciando uma tendência às estruturas mais baixas e maciças, que fora adotada pelos arquitetos Ming, criadores de muitos edifícios retangulares. Os templos Ming conservaram alguns detalhes Song, como as figuras de madeira de seu interior pintadas com grande colorido. Já os imperadores Qing preferiam interiores amplos, quase monótonos, desprovidos de detalhes. Os palácios, muitos dos quais ainda existem na cidade de Pequim, são a marca especial da arquitetura Qing e se caracterizam pelas formas maciças, construídas numa estrita simetria. A cor desempenha um importante papel nesses edifícios de telhados dourados, com detalhes pintados em vermelho e com escadas de mármore branco.



Xangai teve sua origem há aproximadamente 5.000 anos, com um pequeno povoado de pescadores. A cidade cresceu até transformar-se no principal porto da China, no século XVII. Atualmente, é a maior cidade do país e a de maior densidade populacional. Muitos dos canais de Xangai facilitam o transporte de mercadorias dentro da cidade: na imagem, um canal atravessa um salão de chá (esquerda) no bairro velho.

Arte Chinesa no séc. XX

O forte sentimento de nacionalismo provocou ondas de instabilidade política que culminaram com a derrota da dinastia Qing em 1911. Com a fundação da República da China, sob o mandato de Sun Yat-sen, iniciaram-se as pressões para modernizar o país e aceitar muitas das idéias ocidentais, que, logicamente, afetaram também a arte. Muitos pintores foram estudar no exterior — primeiramente no Japão e depois na Europa, sobretudo em Paris. Ao regressar à China, introduziram numerosas inovações, como as cores atrevidas e outras características da pintura européia em matéria de pincelada, perspectiva e tendência à abstração. As artes decorativas, no entanto, absorveram menos a influência externa e seguiram a demanda dos estilos tradicionais, tanto para consumo interior quanto para tudo o que é exportado.

O estabelecimento da República Popular da China, em 1949, introduziu outro campo importante na arte e na cultura do país. Sob o mandato de Mao Tsé-tung, o conteúdo político foi incutido na pintura e nas artes decorativas. Os estilos pictóricos procediam das escolas posteriores à dinastia Qing, porém incluindo nos temas os louvores à reconstrução socialista. Muitas artes populares tradicionais, que não haviam sido reconhecidas como tais durante os períodos dinásticos, passaram a ocupar um lugar destacado. As artes têxtil, da cestaria, da joalheria e da gravura em madeira se somaram às da cerâmica, da laca e do entalhe em jade, ante a importância cobrada ao artesanato tanto para o uso interno quanto para a exportação. Depois da morte de Mao, ocorrida em 1976, a arte chinesa se apresenta menos politizada em todos os sentidos, o que permitirá julgar melhor sua evolução futura dentro do contexto de sua tradição histórica.

TEXTO 13 - LITERATURA CLÁSSICA INDIANA.

PESQUISADO E POSTADO, PELO PROF. FÁBIO MOTTA (ÁRBITRO DE XADREZ).

REFERÊNCIA:
http://indologia.blogspot.com.br/2008/04/literatura-clssica-indiana.html

Literatura Clássica Indiana
Generalidades
Não dispomos, para o ingresso no hinduísmo, de um texto comparável, em importância e santidade, ao Veda, ao «Absoluto - em - forma-de-palavra», como lhe chamam. Os documentos mais antigos da Índia pós-védica (abstraindo os tratados canônicos do jainismo e do budismo, que se encontram fora do hinduísmo e, por conseguinte, do nosso assunto), são a Grande Epopéia e, depois, os Purânas. São textos sânscritos, redigidos numa língua muito mais modernizante que mesmo a dos documentos menos antigos do Veda. Mas não se trata de textos religiosos, embora o elemento religioso ocupe um lugar considerável. Com efeito, é o Veda que continua, pelo menos nominalmente, a servir de base às crenças hinduístas. A especulação concentrar-se-ia por muito tempo, de forma privilegiada, nos Upanishads. Somente os Brâhmanas e Sûtras foram relegados para a categoria de técnicos, confinados ao ensino escolástico. Por outro lado, surgiram textos novos, ora prosseguindo na estrutura dos textos védicos, ora afastando-se mais ou menos deles.[...]

Os Vedas
Os únicos monumentos da religião védica são textos, de data e inspiração variadas. Esses textos formam um conjunto excepcionalmente amplo e importante, embora o que se conservou até nós represente apenas, segundo a tradição, urna pequena parte do que existia na origem. Com efeito, essa literatura foi-nos transmitida repartida por escolas, a que a tradição chama «ramos», as quais começaram por ser em número de quatro, em virtude da função quádrupla dos celebrantes, e depois cindiram-se noutros «ramos» devido aos ensinamentos particulares a que deu origem o desenvolvimento progressivo da pràtica religiosa e sua extensão através de toda a Índia. Ora, nem todas as escolas primitivas, nem todos os ramos secundários (nem a totalidade ou a integridade dos textos num mesmo ramo) chegaram até nós, muito longe disso.
Os textos mais importantes e, de resto, os mais antigos são as quatro «compilações» (Samhita) que formam aquilo a que se chama “os quatro Vedas”. O termo veda, que significa «saber», também se emprega, num sentido amplo, para designar toda ou uma parte da literatura ulterior, fundada numa ou noutra das quatro Samhitâs.
São: 1) O Rig-Veda ou «Veda das Estrofes», o documento das literaturas indianas mais antigo: reunião de cerca de mil hinos às divindades, que prefigura uma espécie de antologia obtida compilando as peças conservadas por velhas famílias sacerdotais; a maior parte desses hinos refere-se mais ou menos diretamente ao sacrifício de soma; no entanto, alguns têm urna relação muito reduzida ou mesmo nula com o culto;
2) O Yajur-Veda ou «Veda das Fórmulas», que nos é transmitido em várias recensões: urnas combinam-se com as «fórmulas» que acompanham a liturgia dos elementos de um comentário em prosa -é aquilo a que se chama o Yajur Veda Negro-, enquanto outras apenas dão as fòrmulas e trata-se então do Yajur-Veda Branco;
3) o Sâma-Veda ou «veda das Melodias» é urna coletânea de estrofes como o Rig-Veda, no qual, alias, essas estrofes se inspiram na quase totalidade, mas estão dispostas com vista à execução do cântico sagrado e comportam notações musicais;
4) Finalmente, o Atharva-Veda é também uma compilação análoga ao Rig-Veda, mas de caráter em parte mágico e em parte especulativo. A tradição fala com freqüência de «três Vedas» ou da «tripla ciência», porque considera implicitamente o Atharva estranho à alta dignidade própria dos «três Vedas». Seguem-se, na ordem cronológica, os Brahmanas ou «Interpretações sobre o brama», comentários em prosa que explicam quer os ritos, quer as fórmulas que os acompanham. Há os ligados aos diferentes Vedas e até dois ou mais de dois para todos os Vedas, exceto para o Atharva. Estes dois primeiros ramos da literatura védica formam aquilo a que se chama a çruti ou «revelação»; por outras palavras, passam por ser de origem divina, resultar de uma comunicação por «vidência» feita a determinados seres humanos privilegiados. A çruti comporta ainda textos mais breves, completamente naturais dos Brâhmanas, os Âranyakas ou «Tratados Florestais», próprios para serem recitados longe das aglomerações, c os Upanishads ou «Concepções», que se envolvem no vivo das especulações.[...]

Textos de tipo védico
a) Os Upanishads pós-védicos fabricaram-se sem descontinuidade até aos confins da era moderna. Há visnuítas, çivaitas e tântricos e alguns com afinidades particulares com um ou outro sistema filosófico. Alguns Upanishads do período védico permitiram o acesso a valores novos: crença num Deus pessoal, exaltação da mística, etc., e foi assim que se pôde classificar uma delas, a Çvetâçvatara, como «a porta de entrada do hinduismo».
b) Os Sûtras védicos relativos ao «direito» civil e religioso deram impulso a uma vasta literatura que fazia a substância daquilo a que se chamava Smriti ou «tradição memorizada». Essa literatura, que abarcava a denominação geral de Dharma-Çàstra ou «Ensino sobre a Lei», conservou-se, pelo menos no início, penetrada de religiosidade, enchendo-se a pouco e pouco de valores profanos, elementos de um direito secular, problemas de governo e administração, etc. Assim, o famoso texto conhecido pelo nome de Leis de Manu, cuja data exata é indeterminável (por volta dá era cristã, sem dúvida), proporciona um quadro muito completo da sociedade indiana, das classes e das castas, mas também engloba regras religiosas aferentes ao velho ritual doméstico. Principia por um exórdio cosmogônico, para terminar numa doutrina sobre os atos, o destino da alma e a libertação. Outros tratados análogos revelam-se mais continuamente profanos, mas a marca religiosa acha-se gravada em muitos dos seus pormenores.

Textos épicos
A Grande Epopéia desenvolveu-se pouco a pouco, a partir do século II antes da nossa era (e ainda antes em alguns episódios), nos meios de bardos e genealogistas adstritos a diversos principados do Norte da Índia. Essas longas descrições, aumentadas e modificadas gradualmente, conduziram à redação de duas vastas epopéias: o Mahâ-Bhârata ou «A Grande Guerra dos Bharatas» e o Râmâyana ou «A gesta de Râma». A sua conclusão pode ter exigido quatro ou cinco séculos. Tanto umas como outras, essas obras concentram-se em personagens reais, privilegiadas no plano divino. A primeira narra as aventuras da família dos Pândavas, cinco irmãos, alvo do ódio dos seus primos contra os quais reivindicam o reino: a luta surda culmina com uma batalha impressionante na qual perece a maior parte dos chefes; os cinco irmãos e a sua esposa comum, Draupadî, sobrevivem, mas para desaparecerem pouco depois, ceifados por uma morte sobrenatural. A segunda epopéia, mais curta, mais condensada, descreve a vida do herói Râma, que desposou a princesa Sîtâ e, tendo-a perdido, raptada por um demônio, parte à sua procura e reconquista-a no final de uma longa guerra. No entanto, em conformidade com a tendência para a tragédia das epopéias, Sîtâ acaba por seguir o caminho da floresta e sucumbir a morte sobrenatural. Os dois textos são, sob diversos aspectos, de caráter religioso: não só pelas cenas maravilhosas que abundam, clima mítico e divinização dos heróis -Krishna por um lado e Râma por outro (isto pode dever-se a uma redação posterior)- mas, sobretudo, pelo sermão quase permanente que desenvolvem sobre a ética e o ideal hinduístas, sobre os deveres das castas, as prerrogativas do brâmane, etc., ao ponto de, por momentos, pelo menos no Mahâ-Bhârata, a narração parecer uma simples ilustração do dharma hindu. Foi com inteira justificação que se considerou o Mahâ-Bhârata uma soma do hinduísmo, enquanto o Râmâyana era já mais secularizado. Finalmente, a primeira epopéia contém um episódio que se reveste da dignidade de uma espécie de Evangelho, a Bhagavad-Gîtâ ou «Canto do Bem-Aventurado»: são as palavras que, antes da grande batalha, o herói Khrishna, cocheiro do carro de Arjuna (um dos cinco irmãos), dirige ao seu companheiro para o incitar a agir. Em seguida, mostra-lhe que só o ato desinteressado tem valor e, por fim, gradualmente, atrai-lhe o pensamento para o Ser supremo, guardião e garante dos atos, para os métodos que se oferecem para chegar até Ele. E então que o «cocheiro» de Arjuna se revela na sua verdadeira natureza, através de uma teofania grandiosa, como sendo precisamente esse Ser supremo que Arjuna procurava confusamente. Foi considerável a repercussão deste texto, venerado em numerosas seitas, infatigavelmente recitado, comentado, imitado ou traduzido.

Os Purânas e Tantras
Os Purânas ou «Antiguidades» são mais vizinhos, ao que parece, daquilo a que chamaríamos tratados religiosos, porque contém de forma prolixa ensinamentos sobre a prática e o ritual, dados sobre as festividades e peregrinações e elementos de mitologia: assiste-se às lutas da grande Deusa contra os demônios, às aventuras guerreiras, galantes ou ascéticas de Çiva, à biografia de Krishna. Mas o seu objetivo próprio é muito diferente. Trata-se de textos com pretensões históricas, que querem descrever a história das dinastias ou pelo menos das genealogias reais e apoiar as bases dessa história por uma cosmogonia e uma teogonia que mergulham no mais profundo das eras míticas. A pouco e pouco, esses textos, carregados de interpolações, encheram-se de materiais de todas as procedências. Alguns parecem ter sido concebidos para as necessidades de urra seita particular, e os Purânas superiores, em número de dezoito, foram classificados pela tradição como Purânas vishnuítas, çivaítas e bramaítas (=dedicados a Vishnu, Çiva e Brama). O mais célebre desses textos, mas não o mais antigo, é o Bhâgavata-Purâna, que descreve a vida do herói-deus Krishna (p. 47), insistindo nos motivos que regem a devoção: seria o texto de ligação das seitas krishnaítas.
A literatura dos Purânas pode estender-se, no seu conjunto, dos primeiros séculos da nossa era até ao século XII e porventura mais além. Em torno dos Purânas secundários ou menores gravitam hinos, litanias, «glorificações» de lugares santos, etc. Podem anexar-se a este tipo literário o Yoga-vásishtha, imponente poema lendário e filosófico (séc. X ?), e o Caturvargacintâmani de Hemâdri (séc. XIII), vasta coletânea mista entre o gênero purânico e a Smriti.
Mais ligáveis a estas seitas ou grupos de seitas são tratados análogos aos Purânas, a que por vezes se atribui a designação de Tantras «Livros». Mais freqüentemente, distinguem-se entre esses Livros os tratados vishnuítas ditos Samhitâs ou «Coletâneas», os çivaítas ou Âgamas «Tradições» e, finalmente, os Tantras propriamente, que se referem a um aspecto da religião denominado, segundo eles, tantrismo que não é destituído de afinidades com as seitas çàktas . Foram fabricados Tantras quase até aos nossos dias. Com efeito, esses Tantras (no sentido amplo do termo) são as verdadeiras bases literárias do hinduísmo como se pratica na atualidade. Encontram-se neles descrições rituais minuciosas (rituais de simbolismo e de adoração), elementos de doutrina e de ética e, finalmente, métodos próprios para aperfeiçoar a individualidade psíquica (ioga).

Outros textos sânscritos
O resto do que temos para enumerar, ou deriva de um sector particular e abordá-la-emos no capitulo VI ou pertence a gêneros propriamente literários, de execução erudita, e é nesse âmbito que se deve analisar:
a) Em primeiro lugar, há o conjunto de textos sânscritos que representam aquilo a que se pode chamar belas-letras: contos e romances, poesia lírica e didáticas, teatro. Se os contos (diferentes dos das tradições búdicas e jainas) só remotamente são obras religiosas, podem considerar-se, em contrapartida, numerosos os dramas e ainda mais os poemas de inspiração devota. Muitos vulgarizam as doutrinas filosóficas cujas convivências com a religião se conhecem, enquanto outros são, diretamente, hinos à glória desta ou daquela divindade. Temos assim estrofes líricas em Vishnu, em Çiva, na Deusa, odes ao Sol, numerosas peças intituladas «Vaga de graça» ou «de beatitude», «Atração pela tranqüilidade», etc. Uma obra dramática como o «Despontar da Lua do Conhecimento» (séc. XI) descreve de forma alegórica a vitória do Vedânta vishnuita sobre as outras seitas e sobre as heresias. Trata-se, pois, da edificação. Mas a maior parte das obras de alta lírica, aquilo a que se chama «grandes poemas» ou epopéias líricas, têm uma efabulação de origem semi-religiosa, porquanto inspiram o seu tema na Epopéia e nas Purânas e, exaltando o dharma hindu, abordam fatos de culto ou de adoração, recordações de mitos e de lendas piedosas. Deste ponto de vista, pode-se considerar Kâlidâsa, o grande poeta lírico e dramático do século V (aliás, data motivo de controvérsia), um autor religioso, pois a ordem social, a ética e a função real são os aspectos de uma mesma realidade ou, se se quiser, de uma mesma norma, que também engloba a religião.
b) Obras singulares que merecem ser notadas à parte, senão pela sua feitura que é a da lírica usual, mas pelo seu conteúdo, são os poemas ambíguos, que se interpretam simultaneamente como divertimentos eróticos e como a expressão da devoção mais ardente: trata-se do resultado de algumas tendências pietistas que prevaleceram a partir de uma certa época. A mais conhecida dessas obras é o Gîtagovinda ou «Canto do Pastor» (séc. XII), uma espécie de pastoral requintada que descreve os amores do deus Krishna e da iovem Râdhà em termos de um realismo intenso, no estilo do Cântico dos Cânticos.
c) Segue-se a literatura filosófica. Não existe, de modo algum, entre filosofia e religião a demarcação que estamos habituados a estabelecer. Aquilo a que se chama (impropriamente) sistemas filosóficos, e não passa de «concepções» (darçana), ou seja, de pontos de vista diferentes de uma mesma realidade supra-sensível, tomaram todos em diferentes graus, por objetivo, o acesso à Libertação; de especulações livres, tomaram-se soteriologias e enveredaram pela via do teísmo. O primeiro desses darçanas, a Mîmâmsâ, que era uma «reflexão» sobre o ritual védico, preocupou-se tanto com problemas teológicos como o segundo darçana, o Vedânta ou «Fim do Veda», que, desde a origem, tentava elaborar, com base nos Upanishads, uma ontologia e uma mística. De resto, o Vedânta, a partir pelo menos do século XII, agregou-se em grande parte a determinadas seitas e empenhou-se em demonstrar valores de amor-fé, de graça, de abandono a Deus. O sistema Sânkhya, pólo oposto ao Vedânta, porque instaurava um dualismo essencial da matéria e do espírito, tomou-se igualmente teísta, como era o Ioga desde a constituição em darçana: o Ioga junta a uma especulação inspirada no Sânkhya uma busca prática de uma natureza diferente: uma técnica psicofisiológica para acesso a estados e poderes supra-humanos. O Ioga é, em certos aspectos, mais uma magia que uma religião, mas não deixou de ser arrastado pela corrente do tantrismo e do hinduismo geral. Quanto ao Nyâya e ao Vaiçeshika, os dois últimos darçanas, eram tentativas de explicação científica, incidindo um na lógica formal e na teoria do conhecimento e o outro nas «categorias» e na teoria dos átomos. Tanto um como o outro sofreram a atração das formas religiosas e, por exemplo, a lógica instaurada pelas escolas do Nyâya serviu para demonstrar a existência de Deus.
Convém finalmente notar que disciplinas semicientificas (como a alquimia) se deixaram penetrar por idéias místicas, que a astronomia andou muito tempo a par da astrologia, etc.

As fontes não sânscritas
As línguas derivadas do sânscrito (neo-indianas, indo-arianas modernas, como por vezes se lhes chama) -em especial o bengali, o marata e o hindi e as línguas dravidianas por outro lado (as do Sul da Índia, que são pela origem estranhas ao sânscrito, penetradas em diferentes graus por influências sânscritas) deram lugar igualmente a vastas literaturas religiosas. Essas literaturas insistem com freqüência em aspectos novos da crença, que eram mais ou menos mal atestados pela literatura sânscrita: assim, no Sul, na mitologia, algumas práticas diferem, pelo menos nos nomes, do que existe no Norte. O emprego dos vernaculares no Norte originou a invasão de noções populares, fatos de devoção ingênua, práticas sectárias, que não tinham conseguido encontrar audiência na literatura antiga, sempre um pouco hierática.

As literaturas dravidianas
O tâmul (falado na região que vai do Norte de Madrasta ao extremo sul da península) tem uma literatura cujos primórdios (anteriores ao Século VII) são puramente laicos, ao contrário do que acontece na maior parte dos outros domínios literários: os costumes bramânicos e os cultos locais são mencionados aquie ali, mas em todo o ciclo do Sangam -a «academia» que agrupa os textos mais antigos em língua tâmul - só se encontra um poema isolado, o «Guia de Muruga», que atesta uma inspiração religiosa: trata-se um elogio de Muruga, o Skanda dos paises do Sul, filho da Deusa temível. Os textos que seguem ao Sangam revelam uma mistura em que os dados jainas e budistas interferem com fatos propriamente hinduístas. Seria necessário esperar pelo século VII para assistir àquilo a que se chamou «despertar çivaita», com um grupo de sessenta e três santos, vários dos quais deixaram nomes na poesia, sendo o maior Mànikka Vàçagar, cujas odes se caracterizam por uma admirável inspiração lírica. A partir do século XI constituem-se Purânas çivaítas. Paralelamente, um movimento vishnuíta entra em ação com os Àlvârs, série de doze sábios aos quais se atribui uma vasta coletânea de hinos, o «Veda tâmul», em que domina a figura Nammâlvâr, no século IX. Sucedem-se numerosas obras até aos nossos dias, entre as quais ocupam um lugar destacado as adaptações de obras sânscritas, em particular da Epopéia.
Em kannara (região de Mysore e noroeste dai), a literatura é mais recente. Trata-se, em grande parte, dos textos da seita dos Lingâyats: lírica, lendária, obras de controvérsia, pelo menos a partir do século XII. Também se encontram textos vishnuítas a partir do século XIV, com apogeu no XVII.
Em telugu (Norte e Nordeste de Madrasta até Orissa), as obras religiosas abundam a partir do século XI, mas tratam-se, sobretudo, das adaptações da Epopéia e dos Purânas. Seria necessário esperar por Vemana (séc. XV ?), para ver surgir uma inspiração autônoma, nitidamente popular, que deu impulso a uma religião sem práticas exteriores.

in Renou, L. O Hinduísmo. Lisboa: Europa-América, 1969

TEXTO 12 - ESCULTURA INDIANA.

PESQUISADO E POSTADO, PELO PROF. FÁBIO MOTTA (ÁRBITRO DE XADREZ).

REFERÊNCIA:
http://indologia.blogspot.com.br/2008/04/escultura-indiana.html

Escultura Indiana
Os primeiros monumentos da escultura começaram a aparecer apenas no século III a. C., no período Maurya, dois séculos depois da antiga civilização indiana. Não podemos duvidar que a arte tenha continuado a existir durante esse longo período; mas com o desaparecimento do material perecível desses tempos pré-históricos (argila, bambu e madeira) não se encontrou nada até agora, exceto algumas figuras de barro. Foi nessa época que sobreveio a invasão ariana, que trouxe sangue novo ao país mas demorou séculos antes de se manifestar na arte.
A produção artística da época dos Gupta, no século VIII, foi considerada como o período clássico da escultura indiana. Esta classificação, que apenas tem de comum com a do classicismo grego o sentido de um alto valor estético, diferencia-a pelo gênero - mas não qualitativamente - da escultura da Idade Média e da plástica dos ícones dos séculos VIII - XIII. Os demônios das árvores e da fecundidade, conhecidos pelos nomes de jakshas e jakshis, que na época Gupta inspiraram a grande escultura, podem ser considerados como os precursores de uma escultura clássica, e o capitel dos leões de Sarnate, da época de Ashoca (segunda metade do século III a.C.) possui já um estilo clássico. O fragmento da mulher vestida de luto de Sarnate , com a flor de lótus atrás do seu corpo juvenil e diante dela o pyreum que serve para acender as fogueiras, deixa entrever as grandes possibilidades desta época.
Os Baixos relevos rupestres das grutas - mosteiros de Baja, nos Gates ocidentais, de Caudaigiri e de Udaiagiri - apresentam um estilo diferente. Na varanda do antigo vihara rupestre de Baja, os baixos-relevos laterais da entrada representam os deuses brâmanes Surya e lndra. O deus solar, acompanhado das duas esposas, passa num carro puxado por quatro cavalos, conduzido por dois demônios do sexo feminino, cujas formas abundantes mostram que a figura milenária da deusa-mãe continua viva. Indra, o gigantesco deus da tempestade e da guerra, avança montado no seu elefante Airavata, com o seu vajra (o machado do trovão), na mão esquerda, por cima de uma paisagem na qual se podem observar, entre outras coisas, duas árvores com uma vedação à volta, sem dúvida consagradas a espíritos da Natureza.
O espírito védico continua a impregnar esses baixos-relevos bem como os das grutas de Jaina-Udaiagiri (150-50 a. C.), um dos quais representa a caçada de um príncipe perseguindo um antílope alado, provavelmente segundo a história da vida anterior de um tirthankara (patriarca jailia). Deve datar aproximadamente do principio da nossa era o retrato de um casal de fundadores na fachada do grande chaitya rupestre de Karli.
Os baixos-relevos mais antigos da arte búdica indiana encontram-se nas cercas e portas das stupas de Bharhut, Bodh-Gaya, Sanchi, Amaravati e em numerosos vestígios de stupas da região do rio Kistna. Os temas escolhidos são os símbolos e as práticas do culto paleobúdico, as narrativas da vida lendária de Buda e as suas encarnações anteriores (jatakas). Nos baixos-relevos da cerca da antiga stupa de Bharhut (no Museu de Calcutá) distinguem-se dois estilos diferentes, um primitivo e outro mais evoluído, que, no entanto, podem datar da mesma época (segunda metade do século II a. C.), porque, segundo as inscrições, trabalharam neles escultores de diferentes regiões da Índia. A decoração é constituída por pilares com forma humana de tamanho natural, que representam jakshas e jakshis (demónios), de pé, e por baixos-relevos descritivos, cujo tema é inspirado nos jatakas. O friso de lótus das barras superiores é guarnecido com frutos, animais, cenas de adoração e fábulas de animais.
Os relevos a duas dimensões esforçam-se por fazer aparecer duas vezes, se necessário, todas as personagens importantes para a narrativa, em qualquer ponto da superfície. O medalhão em relevo, num pilar, onde se vê a fundação do Mosteiro de Jetavana, mostra o jardim que o comerciante Anathapindika comprou ao príncipe Jeta a fim de construir um refúgio destinado a abrigar Buda e a sua comunidade durante a estação das chuvas. Os servidores estão ocupados a guarnecer de moedas quadradas e devidamente cunhadas o solo, em grande parte liberto das árvores. Estas moedas são trazidas por carros de bois e devem perfazer o preço convencionado da compra.
No lado esquerdo, que refere a cena seguinte da narrativa, os edifícios do culto estão já terminados, a multidão acorre para assistir à cerimônia da consagração que Anatha- pindika, que figura em duas imagens sobrepostas, se prepara para realizar deitando a água de uma bilha sobre as mãos de Buda, que não está representado. As figuras apresentam-se de frente e de perfil. O tempo e o espaço, a perspectiva e as proporções não são, agora, problemas que se ponham ao artista. Apenas lhe importa ser claro, o que obtém limitando-se às. figuras indispensáveis.
A reprodução da veneração do caracol de cabelo do santíssimo no céu dos trinta e três deuses (paraíso de Indra) apresenta já um relevo plasticamente mais acentuado, com edifícios em que aparecem todos os pormenores. A veneração dá-se sob a forma da procissão habitual à volta do edifício central, em cujo altar estão colocados os cabelos trazidos pelo próprio Indra, depois de Bodhisattva Gautama os ter cortado em sinal de desinteresse pela vida terrestre. Os deuses olham através das janelas dos seus palácios e os apsaras executam, ao som da música, uma dança solene.
Uma comparação entre a jakshi de Bharhut e uma outra do século III a. C., do Museu de Patna, mostra como evoluiu a reprodução da figura humana no decorrer de um século. As jakshis, cujas formas femininas eram ainda exageradas, transformaram-se em mulheres esbeltas que, apesar de um certo arcaísmo, se adaptam com à-vontade às suas funções de guardas das portas. Os corpos tornaram-se unidades orgânicas e têm a moleza, a flexibilidade insinuante e as linhas fluidas dos vegetais, que conferem a originalidade à arte indiana.
O apogeu na evolução dos baixos-relevos das cercas e portas da arte búdica primitiva é atingido com as quatro magníficas portas triunfais da cerca da grande stupa de Sanchi, que datam da segunda metade do século I a. C.
As deudrides (divindades das árvores), nos ângulos das vigas transversais, tornaram-se figuras plásticas perfeitas, que, conscientes do seu encanto, balançam os membros graciosos nos ramos das árvores. As travessas, com os baixos-relevos descritivos que contam a vida de Buda e as vidas anteriores, estão rodeadas por símbolos heráldicos e figuras animais. Uma prova da procura constante de melhores soluções, nessa época de evolução intensa, é dada pela comparação dos capitéis dos pilares. As lajes circulares que cobrem os pilares de apoio da Porta meridional foram substituídas na parte setentrional por lajes quadradas nos pilares quadrados, o que aumenta a impressão de solidez arquitetônica.
A decoração de cabeças de leões e elefantes, em movi- mento rotativo, na porta de leste, é substituída, na porta de oeste, por uma composição muito mais satisfatória do ponto de vista arquitetura, com quatro anões que transportam o pedestal superior, o que realça a função do suporte. Esta solução agradou tanto que foi repetida igualmente na quinta porta da stupa 3 em Sanchi. Este motivo de cariátides, inspirado na arte helenística, foi depois muito usado pela arquitetura indiana nas galerias e varandas; através do budismo chegou até à China.
As figuras dos baixos-relevos das traves estão tão unidas umas às outras que tapam completamente o fundo. O artista dominou todas as posições e todas as contorções do corpo humano. Nas travessas da parte interior da porta de oeste, pode ver-se o rei de Mala trazendo as relíquias de Buda para Consinagara (ao alto); a guerra das relíquias (ao centro); a tentação (em baixo). O templo que está representado ao centro, em Bodhi-Gaya, no lugar da tentação, é uma construção posterior que data do rei Ashoca (172-232 a. C.).
Se nos baixos-relevos de Bharut se começam a notar tentativas para dar a noção do espaço, em Sanchi já se verifica uma representação convencional e evoluída, com um desenho de edifícios na oblíqua, que pode passar por uma espécie de perspectiva, mas limitada a certos objetos e mudando de um para o outro. Encontramos essa mesma representação do espaço nas pinturas de Ajanta.
Os baixos-relevos de Sanchi fornecem-nos dados de valor. sobre a vida indiana da época. Em completa oposição com a renúncia que está na base da vida de Buda, a vida indiana é representada com todo o seu dinamismo tropical e a ruidosa turba em tumulto do seu povo. Só um álbum ilustrado sobre o conjunto dos quarenta e quatro baixos-relevos das traves poderia dar uma idéia dessa descrição da vida turbulenta da Índia antiga.
“Nada foi esquecido: a vida na corte, na cidade, no campo e no deserto. Eis o príncipe sentado, indolente, no seu trono; e as bailarinas mostram-lhe as suas habilidades; depois, o príncipe sai em excursão, os elefantes erguem alegremente a tromba; cavaleiros galopam, excitados, de um lado para o outro; bandeiras agitam-se ao vento; ao lado do carro real, a escolta desfila, de arco ao ombro, precedida pela música. As varandas estão cheias de curiosos, toda a gente deseja ver o cortejo, até o pássaro no telhado se volta para olhar. Junto à pequena porta da cidade a multidão acotovela-se. Um homem gordo espreita. Finalmente, chega-se ao campo. Para terminar, vê-se o rei num jardim tranqüilo, fazendo as suas orações ao Altíssimo. Noutro lado, o soberano entra triunfalmente na sua residência com as relíquias de Buda. Reina a emoção na cidade; as varandas estão novamente cheias e os guardas exercem a sua vigilância do alto das torres. Os primeiros cavaleiros lançam os seus cavalos pelas ruas. Podem ver-se refreando os seus fogosos corcéis...Mas o artista não se interessa apenas pela atividade agitada dos grandes deste mundo; a modesta vida rural exerce sobre ele a mesma atração: simples cabanas diante das quais mulheres pisam o arroz e cozem bolos de farinha no forno, ao mesmo tempo que vão namorando um ocioso; vaivém no tanque da aldeia, onde os habitantes vão buscar água e os búfalos se espojam preguiçosamente, só com a cabeça de fora na frescura húmida. Nem mesmo a vida dos ascetas é esquecida; um velho eremita está sentado diante da sua cabana; no tanque vizinho as noviças banham-se com os animais sagrados e nas árvores os macacos saltam de ramo em ramo. Ou então gente que parte lenha, que acende o lume, que traz comida obtida a mendigar, sendo tudo descrito com a luxuriante vegetação tropical em segundo plano. E, da mesma maneira que nenhum pormenor, incluindo as rédeas dos elefantes e dos cavalos, escapa à observação, cada árvore, cada arbusto está representado com as suas características específicas, de tal modo que ainda é possível ao observador de hoje determinar a sua espécie”. (Bachofer.)
A stupa de Amaravati, cujas esculturas estão expostas nos museus de Madrasta e de Londres, era diferente da de Sanchi. A sua cúpula era erguida sobre um tambor alto, igualmente ornamentado com baixos-relevos. Estava rodeado por duas cercas: a exterior mais alta que a interior, um pouco mais recente, ambas ultrapassando pela magnificência da sua ornamentação figurativa e decorativa o que fora feito até ali no Norte. A sua criação, segundo as inscrições que têm o nome de três príncipes Andhra, situa-se na segunda metade do século II d. C.
Não foi apenas nas margens do Kistna mas também na velha cidade dos escultores, Madura, nas margens do Jumna, que este estilo tardio floresceu sob o reinado dos Kushana, no século II d. C. Apesar das suas divergências, estas duas escolas, a do Norte e a do Sul, conciliam-se com o estilo da época, que se caracteriza pela elegância das figuras esguias e pelos seus movimentos muito livres. No entanto, as figuras de Madura têm mais dignidade; não são frívolas e afetadas como as de Amaravati, que possuem um caráter barroco. Os baixos-relevos dos pilares apresentam cenas quotidianas das classes elevadas; nunca atitudes ascéticas. Em Amaravati, deixou de haver reservas. A veneração dos passos do Altíssimo oferece aos artistas a oportunidade desejada de mostrar a perfeição da sua arte, na interpretação de personagens agachadas em três posições.
Na cena da passagem do rio, Buda é mais uma vez representado apenas pela marca dos seus passos, enquanto os nagas e naginis que o adoram mostram os belos corpos, e a veneração de uma árvore bodhi reúne para a devoção comum animais e pessoas, em todas as posições imagináveis. Este gosto pelo jogo com massas de figuras manifesta-se principalmente nas esculturas das traves das cercas, onde os espaços intermediários, formados por barras onduladas, estão repletos e guarnecidos de cenas de todos os gêneros. Não podemos deixar de admirar um tal domínio das múltiplas possibilidades figurativas e decorativas.

in Diez, E. et FISCHER, K. India. Lisboa: Verbo, 1969

TEXTO 11 - Arte Monumental Budista.

PESQUISADO E POSTADO, PELO PROF. FÁBIO MOTTA (ÁRBITRO DE XADREZ).

REFERÊNCIA:
http://indologia.blogspot.com.br/2008/04/arte-monumental-budista.html

Arte Monumental Budista
O mais antigo monumento da arquitetura sagrada da Índia até hoje conhecido é o altar védico construído com tijolos sobrepostos. O seu equivalente búdico e jainico é a stupa, essa forma arquitetônica do budismo indiano, edificada, segundo as prescrições rituais, para os túmulos reais e os monumentos comemorativos espalhados pela Terra desde há milênios. Gautama Buda teria dito, a propósito dessas edificações, ao seu discípulo Ananda:

«Da mesma maneira que se cuida das cinzas de um rei dos reis, é necessário, igualmente, Ananda, cuidar das do Tathagata. Na encruzilhada de quatro caminhos, devem elevar ao Tathagata um chaitya (de chi, amontoar) e todos aqueles que o ornamentarem com grinaldas, perfumes e pinturas, ou que lhe dedicarem a sua veneração, ou ainda que, ao contemplá-lo, encontrarem a paz de alma, terão grande proveito e longa alegria... As pessoas que merecem um chaitya são quatro: o Tathagata e o «desperto perfeito»; aquele que «despertou» por ciência própria (paceka-boudha) , um verdadeiro discípulo do Tathagata ... Ao pensarem, Ananda, que está ali o monumento a um espírito desperto... muitas almas se vão sentir tranqüilas e felizes. E, como os seus corações estão apaziguados e satisfeitos, voltarão a renascer depois de mortas, quando o corpo estiver desfeito, na bem-aventurança do reino do céu. Eis a razão pela qual, Ananda, o Tathagata, (o desperto perfeito)... merece um monumento.»

Com estas palavras, Buda deu à stupa um significado novo e consagrou-o como o edifício cultual do futuro. Esses montículos não deveriam apenas abrigar almas ou espíritos, ou serem os receptáculos de relíquias e pedras preciosas possuidoras de virtude mágica: deviam ser monumentos para fazer lembrar às gerações futuras os pioneiros da humanidade e incita-las a seguir o seu exemplo. Assim, o chaitya, nome dado à stupa na sua origem, foi elevado de monumento aos mortos a memorial dos vivos. O seu significado deixou de ser apenas a conservação das cinzas funerárias, para se tomar no símbolo das sublimes conquistas do espírito que constituíam o centro da doutrina búdica, a doutrina da Iluminação. Essa a razão pela qual algumas das antigas stupas possuíam pequenos nichos triangulares, onde eram colocadas lamparinas de azeite, de modo que toda a parte superior ficava iluminada, dando a impressão de uma cúpula luminosa.
A stupa simboliza portanto o princípio universal da Iluminação (bodhi) e a eternidade do próprio iluminado, que ultrapassou as fronteiras do individual. A parte arquitetural mais importante da stupa, a cúpula maciça, é, aliás, a reprodução reduzida da abóbada celeste, que reúne debaixo dela tudo o que existe, a criação e a destruição, a morte e a vida. Isso explica que a cúpula tenha sido comparada ao ovo (anda) pelos primeiros budistas e referida, nos mais antigos textos lendários e mitológicos da Índia, como símbolo do princípio criador e sinônimo do Universo, enquanto o belvédere em forma de altar, no alto da cúpula (harmika), simboliza o sagrado, por cima do mundo, para além da morte e da vida.
Da harmika eleva-se um mastro metálico cuja base penetra profundamente na anda, com uma fileira de chattras (pára-sóis simbólicos) e, na ponta, um recipiente para a chuva que corresponde ao dos templos do hinduísmo. A cúpula, na origem, erguia-se diretamente sobre uma base redonda, com alguns metros de altura, cujo acesso se fazia por uma escada exterior e que servia às necessidades do culto. Mais tarde, foi suportada e alteada por uma parte cilíndrica (espécie de tambor) na base da qual se construíram degraus.
As stupas eram rodeadas por cercas de pedra (vedika), as quais, como os quatro pórticos (torana), imitam modelos antigos de madeira. As entradas estão voltadas para os quatro pontos cardeais, o que simboliza o espírito universal da Buda-dhamma (a doutrina de Buda), cuja reputação se espalha por todo o Universo. Essas entradas eram construídas de tal forma que, no seu conjunto, representavam os quatro ramos de um svaslika (cruz suástica), antigo símbolo do Sol; o eixo dessa cruz está situado no centro da stupa. Até as próprias práticas do culto (pradakshina palha), que se fazem da esquerda para a direita, correspondem ao movimento do Sol.
A forma arcaica da stupa, com a sua calote hemisférica largamente aberta quase ao nível da terra, simbolizava perfeitamente a doutrina de libertação deste mundo, ensinada por Buda. Assim, os países budistas que tinham adotado esta doutrina - a Hinayana - permaneceram fiéis a essa forma original durante um milênio. Não só os dagobas primitivos de Anuradhapura, na ilha de Ceilão, edificados entre o século III a. C. e o século III d. C., mas também os mais recentes de Polonnaruwa no século XII não se diferenciam essencialmente, exceto em algumas modificações ulteriores, das stupas de Bharhut e de Sanchi. As suas cúpulas são hemisféricas e a harmika conserva ainda parcialmente a antiga forma; apenas o pára-sol se transformou numa coluna em forma de pirâmide que, provavelmente, simboliza a Arvore da Vida. Em Ceilão, em vez da cerca, a vedação é constituída por círculo de pilares, mais baixos na parte interior e cobertos por um telhado. Pilares semelhantes rodeiam ainda hoje a mais antiga stupa de Ceilão, o Thuparama dagoba, cuja construção original data do reinado de Achoca (273-232 a. C.).
A evolução-formal da stupa acompanhou o desenvolvimento da doutrina e recebeu um novo impulso da nova forma religiosa da Mahayana. A diferença entre a Hinayana e a Mahayana tinha ficado estabelecida no concílio convocado pelo rei Kanishka (posterior ao ano 120 d. C.). No entanto, só raramente existiu uma rigorosa separação das duas doutrinas (mesmo mais. tarde), se exceptuarmos algumas comunidades de monges. Hinayana não conseguiu preservar a sua doutrina, essencialmente filosófica, de um processo de teologização. Era uma tentação demasiado grande e atraente para as massas.
O ideal do Mahayana é o boddhisattva, o santo cuja essência é o “saber”, que se impôs, antes de atingir o estado definitivo de Buda, a missão de dar remédio a desgraça do Mundo. A especulação mahayanista, com céus sobrepostos até o infinito, nota-se na stupa, sobretudo pelo movimento para o alto. As stupas representaram desde então a direção para o Além: é a tendência gótica da doutrina. A antiga cúpula hemisférica concretizava esse impulso para o alto por uma construção em forma de sino, que se elevava de uma base com vários degraus. O número de degraus, a que diversas aplicações horizontais carregam de significado, varia entre cinco e sete, depois passa a nove, onze e, por fim, treze.
A partir do símbolo da mãe original de toda a matéria e causa primeira de todas as coisas, o ovo universal monumental, do qual também fazia parte Brama, de quem procedem todas as criaturas e que ainda era adorado como tal em grutas da época paleobúdica (gruta de Lomas - rishi, chaitya de Guntupalle), foi criada a stupa, encarnação de um sistema de idéias orientadas para o Além.
O nome dhatu garba quer dizer «relicário» e aplicava-se, de principio, apenas à harmika na qual era inumado o recipiente que continha as relíquias. Mais tarde, a anda, a parte em forma de ovo, foi identificada com o dhatu garba e, finalmente, todo o edifício tomou o nome de dhatu garba; em Ceilão: dagoba; na Birmânia: pagode (paya). O sistema dos andares espirituais de especulação mahayanista, concretizado na península indochinesa pelo coroamento recortado tornou-se o elemento principal do pagode chinês.*
*[atualmente este ponto de vista é contestado. N.t.]
Como foi indicado, o pára-sol original que protegia a harmika, em sinal de honra, tornou-se o símbolo da Arvore da Vida e da Iluminação, que sai da cinza do altar dos sacrifícios, da harmika fechada nos quatro lados que encima o ovo do mundo. A haste piramidal do dagoba representa a Arvore da Vida, com os seus mundos superiores, que se podem atingir através de profundas meditações no caminho da Iluminação.
Na stupa indiana, foi elevado o pedestal, originalmente cilíndrico, e construídos vários degraus. A inclusão da cerca e dos pórticos valorizou-a. A ornamentação da balaustrada foi transferida para as paredes verticais da base e, em substituição das toranas, escadas orientadas nas quatro direcções conduziam ao terraço do pedestal. Essas quatro escadas acentuavam o significado cósmico universal do edifício; o que levou automaticamente à transformação da base redonda numa base quadrada, que, por meio de vários degraus, permitiu então o acesso até ao cimo da cúpula.
Esta mudança deu-se ao mesmo tempo que a introdução da Mahayana, cujos textos demonstram que a stupa assim transformada simboliza o caminho da Iluminação e que já não é apenas um monumento em honra dos budas e dos santos mas também um guia para a Iluminação dos homens.

O chaitya

Se a stupa, coroada pela harmika, desempenhava a função de um altar do culto búdico, podemos considerar o chaitya como a igreja do budismo primitivo. Assim como as catacumbas cristãs precederam a igreja, os chaityas foram precedidos de grutas rupestres. Túmulos na sua origem, foram depois transformados para as práticas cultuais, com uma stupa subterrânea, a qual compreendia um vestíbulo que podia servir de sala de reuniões (Yunnar, Guntupalle, Lomas-rishi).
Reunindo os dois locais, obtiveram a sala retangular do chaitya rodeada de uma fila de colunas, que termina por uma abside hemisférica, tendo, na sua extremidade, a stupa destinada às procissões. Os chaityas ao ar livre, originariamente de madeira, sofreram as agruras do tempo e as perseguições posteriores suportadas pelo budismo; os chaityas, juntamente com as stupas, são os mais remotos monumentos da igreja búdica oficial desses tempos.
A mais antiga dessas salas é o chaitya de Baja (c. 200-175 a. C.) nas proximidades de Karli, na costa ocidental do continente indiano (os Gates Ocidentais), a sudeste de Bombaim. A fachada cega, edificada em madeira, desapareceu, sendo conservada, no entanto, em Kondani. Com as varandas suspensas, é uma imitação das construções monásticas (viharas), que, nos antigos mosteiros, existiam à volta de um chaitya. A transposição fiel das suas estruturas e formas ainda hoje pode ser testemunhada pelos arcos de madeira nos grandes vãos exteriores das janelas.
A sala do chaitya do grupo de grutas de Bedsa, a 16 km ao sul de Karli, com divisões de pedra, as colunas, os capitéis em forma de sino, assinala alguns progressos no desenvolvimento desse tipo de construção. A mais importante e a mais bem conservada é a sala rupestre de Karli, cuja escavação está calculada no princípio da nossa era. Aqui desapareceram as reminiscências arcaicas. A sala era fechada por uma parede frontal, sustentada por duas colunas, que hoje desapareceu quase totalmente. Atrás dessa parede frontal, decorada na origem com uma galeria de madeira e que se abria no topo numa colunata para deixar passar a luz, encontra-se o vestíbulo fechado, por sua vez, na parte debaixo, por uma parede ornamentada com esculturas tardias e apenas com três peque- nas portas de entrada.
No cimo da parede existia uma galeria destinada aos exercícios espirituais. A abertura da grande janela de arco é igualmente guarnecida com vigas arqueadas, de madeira de teca. A sala, com três naves, é mais estreita do que o átrio. As quinze colunas que separam, de ambos os lados, as colaterais da nave central são formadas por uma base em forma de vaso, um fuste cilíndrico, capitéis com lótus e um coroa- mento figurativo composto, para cada uma das colunas do lado da nave central, por dois elefantes ajoelhados tendo às costas duas divindades, e no lado oposto por um cavalo e um tigre transportando uma figura cada um.
Em contrapartida, as sete colunas atrás da stupa são simples pilares octogonais sem capitéis. A abóbada é decorada como habitualmente com molduras de madeira, aqui especialmente salientes e bem conservadas. A stupa, muito simples, é composta por duas varandas para as procissões, com balaustradas, uma parte superior com sete degraus e um pára-sol de madeira.
No grande edifício monástico da gruta de Ajanta, existem quatro salas de chaitya, das quais duas, as número X e XI, datam dos séculos II e I a. C., a número XIX do final do século V e a número XXVI de c. 600 d. C.
Nas duas salas mais recentes, aparece já a figura, maior do que o tamanho natural, de Gautama Buda sentado e de pé, no dagoba; e numerosos budas ornamentam, em fileiras, a fachada. As colunas simples transformaram-se em pilares ricamente decorados. A pitoresca decoração primitiva do friso em redor já não era suficiente para o gosto de grandeza que reinou mais tarde e foi substituída por baixos-relevos ricamente ornamentados por “mil budas”. Apenas o tecto conservou as suas molduras tradicionais. O Vishvakarma-chaitya (Vishvakarma, o construtor universal, o arquitecto dos deuses), de Elora, assemelha-se no interior aos dois últimos chaityas de Ajanta, dos quais é também contemporâneo. Possui, no entanto, uma fachada diferente, sem os grandes arcos das portas e com um quebra-luz.

O vihara e o sangharama

O significado literal de vihara é: «local onde se passa agradavelmente o tempo». Eram considerados como tais os ermitérios e os mosteiros. Chamou-se vihara à cabana do monge assim como a qualquer construção onde existisse uma estátua, ou seja, uma capela ou um templo. Por extensão, a palavra serviu igualmente para designar agrupamentos monásticos, que eram compostos por numerosos edifícios, stupas, chaityas e residências para monges. Estas últimas foram também chamadas sangharamas (de Sanga, a comunidade, e arama, o jardim).
A forma dos viharas é muito variada. Trata-se, geralmente, de construções redondas, quadradas ou retangulares, com tetos em forma de pavilhão ou cúpula. Como já não existem hoje senão algumas ruínas de viharas isoladas no Noroeste da Índia, em Gandara, no vale do Swat ou em Caxemira, é através das numerosas representações dessas construções nos baixos-relevos búdicos que se pode fazer uma idéia mais concreta dos seus diversos aspectos.
O plano esquemático ideal do sangharama compreende um pátio aberto, rodeado por celas em fila e varandas. As fundações de tais construções foram descobertas em Sanchi, no país de Gandara, em Sarnate, em Nalanda, etc., e mais tarde na bacia do Tarim. Outros sangharamas foram igualmente cavados nas rochas, juntamente com os chaityas, neste caso designados a maioria das vezes por viharas, o que resultava, em vez do pátio aberto, numa sala fechada com celas à volta, enquanto a parte da frente se transformava numa varanda. Esses viharas rupestres estão em ligação com os chaityas da Índia Ocidental, de Baja, Bedsa, Nasik, Ajanta, Kondani, etc. Em Karli, tinham vários andares, mas ruíram. Os viharas rupestres de Ajanta, na encosta de um extenso vale, têm especial importância para a história da arte; foram cavados durante o milênio búdico, do século II a. C. até ao século VII d. C., e permitem fazer uma idéia geral da pintura búdica.
O principal exemplar de um vihara rupestre de vários andares encontra-se em Elora, centro de peregrinação comum às três religiões da Índia, bramanismo, budismo e jainismo. Podem ver-se em Elora onze viharas anexos ao chaitya. Dois de entre eles são construções de três andares e a sala do terceiro andar, com a sua perspectiva de quarenta pilares em cinco filas, produz um efeito grandioso. Budas e santos ornamentam as paredes. O conjunto de stupas, chaityas, viharas e sangharamas em grandes conjuntos constituía, como lugar de peregrinação ou educação, os centros do mundo budista.
Devemos a Fa Xian, que viajou na Índia de 399 a 413, e a Xuan Zang, que fez a mesma viagem de 629 a 645, as descrições de mosteiros dessa época. Xuan Zang faz de Nalanda, perto de Rajagriha, antiga capital do reino de Magada, uma erudita descrição, segundo a qual podemos ter uma idéia clara do aspecto e da magnificência desses lugares piedosos.
«As habitações dos monges, com quatro andares, estavam situadas nos diversos pátios. Os pavilhões tinham pilares decorados com dragões e vigas que brilhavam com todas as cores do arco-íris, os telhados ricamente ornamentados, as colunas decoradas de jade, profusamente esculpidas e pintadas de vermelho e com balaustradas rendadas. Os lintéis das portas tinham uma decoração especial e os tetos estavam cobertos de azulejos coloridos cujos reflexos os faziam mudar de aspecto continuamente. Existem na Índia milhares de sangharamas, mas nenhum se pode comparar com este em esplendor e riqueza, nem na altura das suas construções»
A reputação de Nalanda é devida a Nagarjuna, o célebre apóstolo do Makayana que ai viveu no século I d. C.
As escavações destes últimos decênios puseram a descoberto onze pátios com celas, edificadas umas ao lado das outras, e várias stupas. Das celas apenas restam os andares inferiores, mas a solidez das paredes indica que eram construídas para agüentar pesadas cargas. As stupas, situadas à parte, tomaram-se edifícios gigantescos em conseqüência das reconstruções sucessivas sobre as antigas construções em ruínas. Esta forma. simplista de renovação por meio de construções maciças era utilizada desde há muito para as stupas antigas.
Mosteiros como os de Nalanda, Taxila, no pais de Gandara, ou ainda Ajánta, eram escolas superiores não apenas para a instrução da teologia búdica mas também para as ciências profanas. Em Nalanda numerosos professores ensinavam os sistemas filosóficos indianos, matemática e astronomia. Era ai que ficava situado o observatório oficial do reino de Magada, cujo clépsidra fornecia a hora oficial ao país. Eram, freqüentemente, incorporadas aos mosteiros escolas de arte, dando assim oportunidade aos monges de se formarem em pintura ou escultura.

in Diez, E. et FISCHER, K. India. Lisboa: Verbo, 1969

TEXTO 10 - Fundamentos Estéticos da Arte Hinduísta.

PESQUISADO E POSTADO, PELO PROF. FÁBIO MOTTA (ÁRBITRO DE XADREZ).

REFERÊNCIA:
http://indologia.blogspot.com.br/2008/04/fundamentos-estticos-da-arte-hindusta.html

Fundamentos Estéticos da Arte Hinduísta
A obra de arte, estátua ou templo, deve provocar uma impressão estética que as escrituras budistas em língua pali chamam samvega, palavra que significa um estado de agitação, de medo, de terror mesmo, ou de paz, de calma divina produzida por uma experiência mental; este estado ultrapassa o plano físico e pode traduzir-se numa emoção dilacerante. E a experiência que se pode sentir diante de uma obra de arte que nos impressiona, escreve Coomaraswamy, na qual distingue duas fases: a primeira, violenta, brusca, de surpresa, que pode comparar-se à chicotada que sobressalta o cavalo; e a segunda, uma experiência de paz transformante, de alegria contemplativa e realizadora.
Os tratados de estética hindu, de poética sânscrita, analisaram este fenômeno que denominam rasa, palavra que significa «essência, substância, gosto»; é o sabor da obra de arte, o sentimento que desperta. Os autores classificaram-no em oito categorias: o sentimento erótico, cósmico, patético, de furor, heróico, de terror, de ódio, do maravilhoso. Os elementos que constituem estes rasas chamam-se bhavas, entre os quais figuram as manifestações exteriores que acompanham este sentimento interior (lágrimas, desfalecimento, pasmo, etc.). Qualquer obra de arte está iluminada pelo rasa que é a sua alma; não é o caráter objetivo da criação artística, mas a experiência humana, que provoca a atividade espiritual, asvada, que desperta e forma a experiência estética pura e desinteressada, uma espécie de êxtase intelectual ou, melhor, intuitivo, se o espectador possui a capacidade e a sensibilidade requeridas. A tripla representação de Siva na gruta-santuário de Elefanta é um exemplo do que dizemos; esse busto tricéfalo de oito metros por seis, esculpido na rocha da gruta, representa o Grande Deus em três aspectos: o rosto central, majestoso e aprazível, é o aspecto impassível do Ser; o da esquerda, é o aspecto renovador, transformador, de Siva, enquanto Deus da,morte; o da direita, é o aspecto feminino, conservador e protetor da vida. Constitui um conjunto admirável que data dos séculos VIII e IX d. .C. É uma das obras-primas da arte hindu, uma representação de conceitos meta físicos na pedra, que sobressai da penumbra da gruta-santuário em que está esculpida. Este êxtase estético pode sobrevir também com a visão de um templo. A Índia teve os seus edifícios de madeira, mas o clima destruiu há muito essas frágeis construções. Apenas restam os testemunhos de pedra, seja em forma de esculturas ou de templos.

Técnicas da Arte Hindu

Os textos tradicionais das técnicas são os Shilpa shastras, que formulam as leis que deve seguir o artista, para não se desviar dos cânones tradicionais, criadores do ritmo, da força vital que deve animar a obra de arte. Apresentados em versículos mnemotécnicos que os artesã os sabem de memória, dão medidas, formas, desenhos simbólicos autorizados, advertências severas destinadas aos obreiros, para evitar que imprimam aos objetos uma forma excêntrica, ou de mau augúrio. Não se omite nada, nem o tamanho, nem o contorno, nem as proporções numéricas, nem os gestos: tudo está estritamente determinado. Resta o gênio do escultor ou do arquiteto que podem sempre, dentro dos limites destas regras, criar uma autêntica obra de arte. Vale a pena admirar o Buda de Sarnath, da escola gupta {séculos VI-VII), a idade de ouro da arte da Índia; está realizado conforme os cânones dos shastras, porém o artista desconhecido que o esculpiu foi um grande mestre.
Não há facilidade na arte hindu, ela exige esforço por parte do espectador: «a própria energia do espectador é a causa da sua experiência estética», diz o Dasharupa (IV, 47-50). Os gestos e as atitudes das imagens divinas não saem da imaginação do artista, mas obedecem a regras precisas. Por isso, os cânones da escultura distinguem as atitudes serenas, equilibradas; as ligeiramente inclinadas, para representar a meditação; as muito inclinadas, «como uma árvore sob a tormenta», para apresentar as ações violentas; e, por último, a atitude tribangha, a curiosa postura indiana caracterizada pelas três posições diferentes dadas à parte superior, média e inferior do corpo, parecida com uma liana flexível ondulando ao vento.
As imagens também foram classificadas segundo o tamanho: os deuses deviam ser gigantescos, sobre-humanos, e os espíritos servidores, de estatura menor; os shastras precisavam os gestos dos braços, dos pés e, sobretudo, das mãos, os mudrãs. Como nota curiosa, encontramos aqui os mesmos cânones que os dos textos sagrados sobre a dança clássica; a arte da escultura e da pintura foi no seu começo um capítulo da arte da dança. Os diferentes elementos dos movimentos da dança, karanas e angaharas, correspondem aos gestos dos braços, mãos, dedos, rosto, olhos, sobrancelhas, corpo, pernas e pés. O tratamento da dança, o Bharata natya shastra, nada deixou ao acaso, e o espetáculo de uma bailarina clássica é ainda hoje uma maravilha. Os artistas e os escultores hindus colheram estas - regras e fizeram, das suas imagens, divinas formas dançantes de uma ligeireza e uma graça etéreas incomparáveis. Os belos bronzes do sul do país, que representam Siva dançando a dança cósmica, rodeado das chamas da vida, vestido com uma pele de tigre e espezinhando o monstro da ignorância, são um belo exemplo destas regras.
Todas as esculturas adotam gestos diferentes, mudrãs, que constituem uma linguagem simbólica preciosa que - se encontra nas figuras da dança clássica, nos gestos de culto tântrico dos deuses e das deusas; existe o gesto do ensinamento, criado muitas vezes nos budas, o do testemunho da terra, o da dádiva, o da segurança divina, o que atrai o fogo, o da meditação, etc. Estes mudrãs às vezes são acompanhados da multiplicação de braços, símbolo dos poderes divinos realçados pelos objetos sagrados que esses braços seguram: o disco da guerra, o raio, o búzio, o alaúde, o rosário, a clava, o chocalho, o tridente, o machado, etc. As formas divinas distinguem-se entre si graças a estes atributos e segundo a cor ou o material de que são feitos. O ideal de beleza buscado pelo artista é puramente religioso, e deve adequar-se aos cânones tradicionais. É uma arte majestosamente impessoal, onde «a arte pela arte» ocidental não tem sentido. Pretender explicar a arte hindu segundo os conceitos do gosto do artista da sua sensibilidade, do seu juízo pessoal, e um engano total. Convém acrescentar, além disto, que esta arte é rigorosamente anônima.
Na Índia restam poucas pinturas, apenas alguns frescos; o clima e as guerras, as destruições muçulmanas fizeram-nas desaparecer. Os tesouros de Ajanta (séculos II a. C. - VII d. C.) puderam-se conservar por terem ficado sepultados sob os desabamentos das pedras da montanha onde os mosteiros e as grutas-santuários tinham sido escavados. Durante mil anos, esses tesouros esculturais e pictóricos permaneceram enterrados até que, por acaso, reapareceram em 1819. Esses admiráveis frescos murais seguem os mesmos cânones que a escultura e obedecem às mesmas regras, mas com mais liberdade. O conjunto é de uma graça extrema, e a Índia considera Ajanta, com toda a razão, como um dos seus principais centros artísticos.

in Riviere, J. Arte Oriental. Rio de Janeiro: Salvat, 1979

TEXTO 9 - UMA ARTE RELIGIOSA.




PESQUISADO E POSTADO, PELO PROF. FÁBIO MOTTA (ÁRBITRO DE XADREZ).

REFERÊNCIA:
http://indologia.blogspot.com.br/2008/04/uma-arte-religiosa.html

Uma Arte Religiosa
A Índia é um país de contrastes e há que admitir que relativamente poucos ocidentais chegaram a conhecer a sua alma. O viajante que percorre este imenso país foi formado pela cultura mediterrânica, pela religião judaico-grega, pela arte greco-romana, pela herança do esplendor de Roma. Na Índia tudo o surpreende, lhe é estranho, diferente: as coisas e a gente, as paisagens e o clima, as formas religiosas e as suas expressões plásticas.
Para ele a arte da Índia é incompreensível à primeira vista, como o é também a sua filosofia de vida. Compreender esta estética supõe um grande esforço por parte de qualquer ocidental, porque nenhum dos seus conceitos lhe é familiar. A nossa intenção é torná-los mais próximos.
A principal dificuldade do Ocidente materialista, cartesiano, cético, praticamente ateu, para compreender a arte tradicional e clássica da Índia reside no fato de se tratar, essencialmente, de uma estética religiosa. A Índia dos nossos dias recorda a cristandade medieval dos séculos XII e XIII; esta comparação pode aplicar-se não apenas aos modos de vida e de pensamento hindus, como também às suas concepções estéticas.
As teorias da arte indiana aproximam-se das exposições filosóficas dos grandes teólogos medievais do Ocidente: a estética da luz, com João Escoto Erígena e Ulrico de Estrasburgo; a estética metafísica de São Boaventura, de Santo Alberto Magno; os simbolistas platônicos, os alegoristas como Ricardo ; de São Vitor; os sistemas estéticos medievais, como os de Tomás de Verceil, encontram-se todos na arte hindu. Se a arte da Índia pode representar as imagens dos deuses e edificar os templos que serão suas moradas, não se trata apenas de imitar a beleza das formas humanas, que foi o ideal grego, mas antes de dar uma expressão à mensagem espiritual, que a forma divina particular considerou que devia chegar aos homens. A beleza procurada na Índia é de origem metafísica. Evoca de maneira irresistível o pensamento de Dionísio o Areopagita, que declarou ser discípulo de São Paulo depois de ter escutado em Atenas o seu discurso sobre o Deus Desconhecido (Actos, XVII, 22 e seg.); chama-se-lhe o Pseudo-Dionísio porque, na realidade, trata-se de um sírio que escreveu em grego por volta do século V. Recebeu uma forte influência de Platão e tentou unificar os ensinamentos deste com os do cristianismo. A sua descrição das hierarquias celestes, dos níveis de manifestação do Ser nos seus graus descendentes e a sua presença inefável em cada coisa, o conceito de luz que o autor utiliza em toda a sua obra, encontram-se muito perto do pensamento da Índia. Platão e os filósofos asiáticos falam muitas vezes a mesma linguagem.
A partir de agora teremos em conta as duas concepções diametralmente opostas da função artística no Ocidente e ao Oriente: a primeira, deve ser a ocasião para uma experiência sensível, afável, agradável, curiosa e talvez estranha, geralmente intelectual na arte moderna; a outra é uma prece, uma contemplação, uma penetração nos níveis superiores da psique humana. A Índia inclui o seu conceito de arte na filosofia de vida. Para resumir isto eu poucas palavras - de acordo com a escola filosófica do vedãnta que domina o pensamento hindu -, pode-se dizer que o mundo dos fenômenos considerado não como uma realidade em si, mas como um aspecto relativo do Ser (Deus), do Ignorado, como uma aparência, mãyã; este Ser, esta Realidade infinita, é profundamente imanente na sua manifestação, na Natureza, no homem, não quantitativa, mas qualitativamente. Tudo está impregnado da sua essência, que mantém o cosmos numa ordem soberana e eterna o dharma; porém o Absoluto em Si mesmo é acósmico. Realiza-se por uma comunhão intuitiva direta e não pol um conhecimento conceptual. O eu interior do homem é idêntico a este absoluto, o Brama do hinduísmo. O mundo - fenomênico em que os seres humanos vão e vêm, numa série sem fim de reencarnações, é uma condição inferior : e ilusória; a libertação final é a saída desse ciclo de dores, de miséria e de morte sem fim. Esta libertação obtém-se com uma severa ética, com uma grande fé na Verdade eterna e com as técnicas de reintegração espiritual que ensina o ioga. Esta é, em síntese, a essência do hinduísmo e, em certa medida, do budismo.
A obra de arte é um meio de reintegração, um sacramento, samskarana, como escreve Ananda K. Coomaraswamy baseando-se nos textos védicos; a aproximação ao divino só pode fazer-se através das formas e das imagens que representam os seus poderes, as suas qualidades. Para não cair numa degradação do sagrado com uma figuração naturalista, a estética hindu in- ventou uma técnica simbólica, para explicar esta hierarquia dos poderes divinos, dos deuses; a forma humana cor- rente transforma-se em pura criação mental obtida, como se verá, com a prática do ioga por parte do artista. Em vez de se degradar nos corpos humanos - onde a beleza sensual desempenha o principal papel, como nos gregos- e de se converter afinal em imagens antropomórficas sem nenhum elemento sagrado, a forma humana converte-se na Índia na representação sobre-humana dos poderes espirituais; a beleza sensual desapareceu e foi substituída pela adição de símbolos evocadores do sagrado. Esta estética, que se encontra entre os primitivos no Egito e no México, é de um surrealismo antecipado; as cabeças e os braços multiplicam-se, as terríficas formas animais sobrepõem-se ao corpo humano, e as dimensões são por vezes gigantescas. Recorreu-se a tudo para provocar o terror e o poder do sagrado, o pânico e o mistério dos mundos sobre-humanos, a presença viva e angustiosa das forças espirituais. A devoção enjoativa e distinta dos devotos ocidentais modernos não tem qualquer relação com este contato vivo e leal do espiritual, cujas descrições aparecem tanto nos místicos ocidentais como nos orientais; vemo-los arquejantes e esmagados pela força insuportável do divino. A estatuária tibetana e chinesa budista é muito interessante nesse aspecto; as entidades protetoras do budismo, na sua gesticulante figuração de pesadelo, opõem-se esteticamente à calma sobre-humana dos bodhissattvas. Há que ter presente que não se trata nem de demônios nem de deuses, à imagem da radical dicotomia judaico-cristã; no pensamento asiático, são forças vivas e ativas na grande hierarquia cósmica, sempre ambivalentes, destruidoras ou benfeitoras segundo a sua situação no universo, repelidas e adoradas ao mesmo tempo.

in Riviere, J. Arte Oriental. Rio de Janeiro: Salvat, 1979